Esta semana foi feita de poucas palavras, o que é significativo quando corresponde à semana em que o Pais do Silêncio foi lançado. A semana em que saí à rua a dizer que sou escritora, assim um bocado a medo, com lábios a tremerem na palavra. Não muito diferente do dia em que me deram o diploma de fisioterapeuta e eu sai à rua com medo que me perguntassem o que eu era e que, logo a seguir, quando eu o dissesse e me mostrassem o punho que doi, o braço que não levanta, o joelho que não dobra, eu não fosse capaz de curar logo ali, de acertar em cheio num diagnóstico sem exame.
Criei um perfil nas redes sociais. Publiquei estas Páginas, a minha casa virtual, na qual ando a trabalhar há algum tempo, e enchi com algumas coisas que já tinha escrito, um bocado renovadas, porque cheiravam a mofo de outros tempos. Foi uma semana de imagem, mais do que de escrita. Foi, portanto, ocupada e desenxabida. Serviu para reforçar a convicção de que, por muito que as palavras hoje em dia vivam feridas de distração, tem de haver desequilíbrio. Ou a escrita ocupa a maior parte do meu tempo disponível para ela — tempo que já é diminuto, vergado a toda as outras logísticas da vida — ou perco a vontade e a paixão de a agarrar.
Fico por aqui, esta semana. Continuamos confinados na Malásia. Mas os dias estão frescos e o parque aqui ao lado abraça-nos todos os dias com o delicado ruído de um silêncio inacabado, interrompido pelas aves, pelo vento nas folhas, pelos peixes na água e por nós. Pela voz dos miúdos, pelos pensamentos que às vezes gritam, pela sensação de gratidão que muitas vezes sai de mim e larga a correr com passos torpes de eterna infância.
Bom fim de semana e, se tiverem tempo, se ele não chicotear os vossos propósitos, leiam esta crónica do António Lobo Antunes intitulada Para a Semana Estou Cá. Foi escrita para a Visão, em 2016 e se calhar muitos já leram. À minha vida, só chegou ontem. Os escritores escrevem muita coisa, mas o que melhor escrevem é o que consegue invadir o teclado ou o papel sem filtro. A verdade que nesse dia não esbarra na mente, que consegue agarrar o punho e dominá-lo e chega crua ao registo. Sabemos tão bem identificá-la, a verdade, quando a lemos. Está lá, no dom das palavras certas, tremendas, que saem em turbilhão a saber exactamente o que querem dizer.